segunda-feira, 30 de março de 2009

Transmissões de Alain Buffard. Good Boy, Good For, Mauvais Genre.


Michelle Moura

Por aqui em Angers, os alunos da FAC (que é a «formação de bailarinos» do CNDC), estão trabalhando sobre duas transmissões: A VIDA ENORME, de Emmanuelle Huynh, que escrevi sobre num post de fevereiro e NEWARK/RE-WORKED, de Trisha Brown, uma peça de 1983. No meio desse contexto de transmissões fica claro o motivo porque tenho me fixado sobre esse tema.
Então, em meio a esse contexto, encontrei com Alain Buffard que està trabalhando em uma nova criação (S.E.S.A.) com o pessoal da FAC.
E foi assim que lembrei que seu solo GOOD BOY (1998) surgiu como uma referência contundente para Ricardo durante a criação do QUASE NU devido certas semelhanças e recorrências - ambas obras são autobiografica e utilizam cuecas, muitas cuecas, como material de cena; brancas para Buffard e vermelhas para Ricardo.
Foi nessa ocasião, quando o Ricardo estava criando QUASE NU e postou no seu blog um video do YouTube (www.youtube.com/watch?v=7JY_3TKoN0U&feature=related) que pela primeira vez vi uma obra de Buffard. Na verdade, o que assisti é uma das transmissões para grupo do solo GOOD BOY. Em 2001, GOOD FOR, foi a primeira experiência de transmissão do solo para um quarteto. Os 3 intérpretes eram coreògrafos amigos e parceiros de trabalho de Alain - Matthieu Doze, Rachid Ouramdane, Christian Rizzo. A partir de 2003, uma série de transmissões dessa mesma obra para grupos maiores ganhou o nome de MAUVAIS GENRE. E de là pra cà, mais de 12 transmissões aconteceram. Inclusive, uma delas aconteceu em Fortaleza.
Fiz uma entrevista com ele e aì està meu exercicio de tradução, o primeiro! Meu modo foi traduzir sem modificar muita coisa ou quase nada, e manter a estrutura. Decidi que era importante que depois de traduzido eu ainda pudesse ler e ter a sensação de ouvir a voz de Buffard. Aì està um trecho da entrevista.

De onde surgiu a primeira idéia de realizar uma transmissão do solo GOOD BOY para um grupo?
Alain Buffard-
Então, a primeira versão foi um quarteto de quatro caras, incluindo eu, Christian Rizzo, Ouramdane e Doze, para um centro de arte conteporânea que fica no sul da França. Um tipo de casa para esculturas, não muito conhecida, mas importante na década de 60. Foi no começo de abril, e você sabe que no sul da França pode ser bem frio, então fizemos essa versão atràs das janelas do ateliê e o pùblico ficou num jardim, um tipo de jardim japonês. E ventava muito! O pùblico cobriu-se com mantas e nòs estàvamos quase nùs. E tinha essa idéia de «objeto humano que dança» atràs das janelas. Foi bem especial! Nòs estàvamos nùs e aquecidos, e o pùblico do lado de fora com muito frio.
E cada performer ficava em uma sala diferente olhando para o centro onde é o jardim japonês. E era como uma real situação de exibição como performer, entre performer e objeto de arte. E, eu tenho certeza que o pùblico teve uma sensação muito especial da mùsica vindo de bem bem longe... Então a idéia de fazer essa performance veio a partir do convite do diretor desse espaço para eu performar GOOD BOY em um espaço que eu não acreditava que fosse bom para apresentà-lo, e eu decidi fazer uma nova versão para 4 intérpretes.

E porque você acreditou que não seria bom apresentar o solo naquele espaço?
Alain Buffard-
Porque naquela época eu não tinha performado muitas vezes GOOD BOY, e não estava muito convencido de que eu podia apresentà-lo em qualquer espaço. Acho que aquela foi a primeira vez que me apresentei em um « site specific », melhor, um « contemporary art site specific ». E eu acho que eu não queria fazer, eu não sei, não via sentido em fazer isso. E, naquele tempo, no começo de 2000, nòs mais ou menos trabalhavamos todos juntos, agora coreògrafos franceses conhecidos como Rizzo e Ouramdane, e era bem comum compartilhar, falar um com outro, dançar um pro outro. Era a idéia daquele tempo e exatamente o oposto agora, hehehe. Então eu os perguntei, e eles disseram « ah sim, porque não ». Eles gostavam do solo. Bom, a gente não tinha muito tempo. Tivemos uma semana, ou dez dias para fazer essa performance em um espaço não frontal. Eu digo, GOOD BOY é bem clàssico, frontal, para caixa teatral. Então eu tive que escolher o ponto de vista. E bem no começo eu imagianava uma sessão da « floor dance » mas não era possivel, porque era tão pessoal fazer isso, era realmente pensado pro meu pròprio corpo e não funcionava com os outros. Depois disso decidi ter um tipo de... não uma partitura aberta, mas uma partitura global. E eu decidi fazer GOOD BOY, e os outros, um tipo de variação disso, e eu seria o « time keeper » ( quem dà a estrutura do tempo). Exceto para o começo e o fim. Então eu tive que saber exatamente o que eu fazia em cada sequência para transmitir, pedir realmente o que eu queria trabalhar. E eles colocaram o pròprio jeito de fazer isso, que era levemente diferente, e acho que era um tanto rico, e me permitiu fazer GOOD BOY em uma outra direção e abrir o solo dos porquês e das razões para eu ter criado esse solo. Eu acho que foi importante para eu livrar-me de medos bem particulares que eu estava lidando para aquela performance, eu digo, a « impotência ». Para mim foi bem especial, porque quando eu estava criando GOOD BOY a questão era bem simples: O que eu estava hàbil de fazer depois de 7 anos que tinha parado e dançar? Com um corpo bem diferente, um corpo sem « treino algum ». E quando eu comecei os ensaios era um tipo de « check up » do meu corpo, de mim mesmo. O que eu posso fazer? Quais são minhas restrições? Possibilidades? O mesmo para eles, pois era tão pessoal, encontrar seu pròprio jeito, pessoal e orgânico de fazer isso.

Você disse que compartilhou um tipo de partitura...
Alain Buffard-
Eu apenas tentei dizer a eles qual era, onde estava o foco de cada sequência, e assim começou a ficar um tanto aberto. E eu não estava interessado em imitação ou em ver o mesmo corpo. Eu estava tão decepcionado com coreògrafos que costumam falar do movimento correto...o movimento correto é aquele que o coreògrafo quer que você faça, e eu realmente não estou interessado nisso. Muito mais em como cada pessoa pode encontrar seu pròprio jeito de fazer o movimento, ou estar presente, ou estar no palco. Então começou assim, e as vezes encontramos algumas variações do movimento original ou partitura original. Mas na sequência « New York, New York », por exemplo, a partitura é de usar cuecas como figurino e cada um tem estratégias bem diferentes para fazer isso, e està realmente ok. E quando eu fiz para um grupo de 15 ou 25 pessoas foi o mesmo. E eu ainda mantenho no grande grupo o meu modo prévio de GOOD BOY como o « time keeper ».
Com o grupo grande, como temos diferentes versões, como teatro « caixa branca » e pùblico que circula...e por causa das caixas de remédios e todos os elementos de cenàrio que usamos, eu tive que ter um cuidado especial, porque as caixas de remédio que usamos são de pilulas de AZT, e foi bem dificil de consegui-las, pois na França é proibido usar elas assim e eu precisava de milhares dessas caixas, e também de milhares de cuecas. São essas caixas que carregamos e usamos para fazer os saltos altos. Essas são as pilulas que tomei em meu primeiro tratamento de HIV. E é totalmente proibido fazer qualquer tipo de menção ou comercial para marcas farmacêuticas na França, então tive que consegui-las na Inglaterra e foi bem difìcil. O presidente do ACT UP(1) em Paris, conhecia o diretor do laboratòrio desse remédio na Inglaterra, e então foi um tipo de Mercado Negro para consegui-las. Assim, essas caixas eram bem preciosas e para que o pùblico não pissasse sobre elas e as destruisse tivemso que encontrar meios para protege-las, e por isso tivemos algumas sequências diferentes da partitura original de GOOD BOY.

No momento de transmitir essa obra, suas questões pessoais de medo, fraqueza, HIV ainda são importantes de serem partilhadas?
Alain Buffard-
Sim, de um lado tem algo bem egoìsta... ok, é minha imaginação pessoal, medos, angustias, questões, e se eu der um pouco disso para os outros talvez eu me sinta melhor. E a questão era: E agora que eu estou fazendo isso como as pessoas vão lidar com isso, inclusive se não estão diretamente interessadas nessas questões. Mas eu acho que todos nòs estamos interessados por nossa saùde, nosso destino e nossa pròpria morte. Mas eu nunca falo realmente disso. É algo do tipo, todo mundo sabe sobre o que GOOD BOY està falando. Eu me sinto muito pùdico sobre isso. Eu apenas desejo que todo mundo lide bem de um jeito ou outro com isso. E às vezes não funciona, não funcionou com Mathilde Monnier, por exemplo. Quando começamos a ensaiar ela começou a ter pesadelos e insônia, foi bem dificil pra ela e ela decidiu não performar.

O que você partilhou ao iniciar o processo?
Alain Buffard-
GOOD BOY é good boy (bom menino)! A història de um homem, ele é homossexual e em um ponto de sua vida, muito jovem, ele descobre-se seriamente doente. E naquela época morria-se 6 meses depois de descobrir a doença, pois não havia tratamento. E para mim era uma grande coisa. E especialmente entre gays, inclusive se são mais jovens que eu. E eu estava indo tantas vezes ao cemitério, meus amigos da minha idade estavam morrendo um depois o outro... e era algo aterrorizador... E eu não podia compartilhar isso com todas as pessoas, estavam todos fazendo seus trabalhos... Eu sabia, eles sabiam e era isso. Eu não podia falar pra eles « Essa història é sobre sua pròpria maneira de lidar com a doença e a "impotência", fraqueza.

O que muda na obra quando se tem uma mulher performando?
Alain Buffard-
Eu realmente gosto de mulheres fortes. Eu posso lidar com um homem fraco, mas realmente gosto de uma mulher forte, como performer pelo menos. Todos eles, homens e mulheres eram performer muito fortes.
De um modo posso dizer que hà bem pouca diferença entre homens e mulhres performando essa peça. Especialmente porque bem no começo.... eu realmente gosto do começo, é uma das minhas sequências preferidas da peça (quando andamos um depois do outro atràs de lâmpadas de neon). Porque o neon faz um borrado do corpo, e as vezes não dà pra saber se o que se vê é homem ou mulher, apenas vê-se uma figura, e eu adoro isso, e começa assim.


(1)Act up é uma associação ativista militante de luta contra a AIDS, de forte identidade « homossexual-soropostiva ».. www.actupparis.org
(2)Agora Buffard està falando da montagem de «Mavais Genre», com vàrios diferentes coreografos.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Traduções

A partir das postagens do Ricardo, da Beti e do Gustavo, achei interessante colocar algumas referências sobre tradução com as quais estive em contato nos últimos meses. É um pequeno panorama das minhas leituras que, espero, deve poder ajudar na discussão sobre ‘tradução’ neste trabalho de pesquisa de linguagem.

Há uma tradição de estudos de tradução que fala em equivalência de significado entre as obras tradutora e traduzida. Quine é um filósofo que põe em cheque esta idéia de equivalência, ou pelo menos a fidelidade de equivalência. Ele é conhecido pela tese de que não há tradução exata, porque sempre há opções alternativas mutuamente exclusivas. Ou seja, ele afirma [ele está falando de tradução interlinguística] que não há fatos objetivos sobre significado, que o significado é sempre indeterminado de modo que qualquer tradução é indeterminada.

Para Walter Benjamin, no artigo clássico “O papel do tradutor”, se tradução for uma operação que depende de similaridade com o original, ela não é uma operação possível. Ele afirma que, mesmo o original sofre mudanças com o passar do tempo -- até mesmo as palavras com significados fixos mudarão. Ele considera a tradução um processo de maturação da obra, pois, com ela, o original tem uma “vida pós-morte”.

Umberto Eco no seu livro “Quase a mesma coisa” propõe que “uma tradução, mesmo errada, permite que se retorne de alguma maneira ao texto de partida” (67). Assim sabemos que a tradução é daquele texto e não de outro. Ele afirma que traduções entre diferentes matérias, como dança, literatura, música, não podem retornar ao texto de partida. Entretanto, sua explicação é vaga e podemos considerar diversas definições para “de alguma maneira”. O próprio Eco acredita, mais a frente em seu livro, que esta reversibilidade é de infinitas gradações, de uma reversibilidade máxima a uma mínima.

Talvez seja interessante destacar referências sobre tradução poética que tem como foco, não a reconstituição da mensagem, mas a função poética do texto, de acordo com Haroldo de Campos. Na tradução poética há outros níveis relevantes, além do propriamente linguístico, como métrica, ritmo, sonoridade, entre outros, deixando de lado a idéia de “passar a mensagem” do texto traduzido. Eco, quando fala de tradução poética, assume que é possível, por exemplo, que o conteúdo seja sobrepujado em detrimento do ritmo da poesia. Isto quer dizer que, em algum nível, o texto alvo (tradutor) não retorna ao texto fonte (traduzido), pois o tradutor deve fazer escolhas sobre aspectos que ele considera interpretativamente mais relevantes.

Haroldo de Campos chega a chamar a tradução poética comprometida com a função poética da linguagem, de transcriação, recriação e tradução crítico-criativa. E Roman Jakobson, de acordo com Campos, afirma que só é possível fazer tradução em poesia através de “transposição criativa”, isto porque “as equações verbais são promovidas à posição de princípio construtivo do texto”. São termos que apenas tentam diferenciar esse tipo de tradução daqueles que apenas se importam com o aspecto semântico.

É importante mencionar que traduções entre diferentes matérias, que Eco chamaria de adaptação ou transmutação, são consideradas por Jakobson traduções intersemióticas na sua tipologia de tradução (intralinguística, interlinguística, intersemiótica). O termo tradução, neste caso, é usado com mais generalidade, considerando operações além da tradução entre diferentes línguas.

Julio Plaza, em seu livro “Tradução intersemiótica”, assume esse tipo de tradução cunhado por Jakobson como projeto artístico. Ele afirma que o que é válido para tradução poética se intensifica no caso da tradução intersemiótica – a criação que determina escolhas em um sistema de signos que é estranho ao sistema original. Para o autor, o processo tradutor intersemiótico sofre a influência não somente dos procedimentos de linguagem, mas também dos suportes e meios empregados, assim será determinante o tipo de material ou meio empregado no resultado da tradução.

Algo que pode ser interessante para se pensar sobre tradução, de modo geral, é sobre o efeito da obra original no leitor/platéia. Para Benjamin, a tarefa do tradutor consiste em encontrar o efeito pretendido no original na tradução, produzindo nela um “eco do original”. Umberto Eco também fala sobre o efeito do original, e que o tradutor deve construir uma hipótese interpretativa sobre o efeito do original e tentar reconstruí-lo. Isso pode ser um norteador em traduções, independente de que tipo.

Outra observação que pode ser destacada é a idéia, que Benjamin acrescenta, de que o tradutor deve expandir e aprofundar sua própria língua através da influência da língua estrangeira. Isso é interessante, pois podemos pensar em diferentes linguagens artísticas ou diferentes artes deixando-se influenciar pela linguagem fonte. Haroldo de Campos concorda com Benjamin citando as traduções de Hoelderlin dos textos de Sófocles. Hoelderlin, de acordo com Haroldo de Campos, tem como característica de seu método de tradução o alto grau de literalidade – literalidade à forma, mais do que ao conteúdo, do original.

Parece-me que a discussão sobre o que é ou não é tradução depende realmente do arcabouço teórico escolhido, tendo em vista as diferentes idéias sobre o que o termo designa. Há, entretanto, idéias que podem auxiliar no trabalho sobre aquilo que pode ser chamado de tradução, transposição, recriação, adaptação, transcriação ou como cada um preferir chamar seu trabalho.

Daniella Aguiar

segunda-feira, 16 de março de 2009

Três encontros num post só

Gustavo


Atrasei um monte para postar alguma coisa aqui. Assim, resolvi juntar as minhas impressões dos três encontros que tivemos, tudo num post só. Lá vai.


ENCONTRO 1


No primeiro encontro, lemos o texto do projeto em voz alta. Algumas coisas que me chamaram a atenção foram a ideia de traduzir (termo que ainda vai render muita conversa) um trabalho artístico para outros suportes, com o objetivo maior de encontrar "o essencial" neste trabalho, o que se mantém dele nessa transposição. Achei que era preciso pensar na função dessa suposta tradução, a que ela se presta.

A outra coisa que saltou aos ouvidos foi partir do pressuposto de que dança é linguagem, e uma linguagem seria traduzida para outra. Não que não seja, mas me pareceu que não dava pra falar assim com tanta certeza, se o que se pretende é investigar justamente isso. Me pareceu que era preciso pensar sobre linguagem, o que estamos chamando de linguagem.



ENCONTRO 2

Fiquei pensando que uma contribuição que eu poderia trazer, pelo menos por enquanto, era compartilhar algumas referências sobre esses conceitos que vêm mais da área de literatura, que no final das contas é um dos assuntos que eu conheço mais teoricamente. Sobre a função da tradução, achei uns trechos de um artigo da Ana Cristina César:


Há dois movimentos possíveis no ato de traduzir.

1) um movimento tipo missionário-didático-fiel, empenhado no seu desejo de educar o leitor, transmitir cultura, tornar acessível o que não era. As variações vão desde o trot ( = tradução literal, palavra a palavra, ao pé do original) à versão literalizada. Tentação recorrente (ou ás vezes recurso inevitável): explicar o original mais do que ele se explicou, acrescentar vínculos que estavam silenciados, em suma, inflacionar o texto original.
A inflação se justifica a si mesma didaticamente.

2) um movimento não empenhado, livre de preocupações com o leitor iletrado ou de um projeto ideológico definido, que inclua digamos a importância de divulgar fulano no país. As variações vão desde bobagens e exercícios de pirotecnia, equivalentes adestrados do tro compromissado com o leitor, àquela coisa fascinante que são as imitações - o acesso de paixão que divide o tradutor entre a sua voz e a voz do outro, confunde as duas, e tudo começa num produto novo onde a paixão é visível mas o nome tradução, com seus sobretons de fidelidade matrimonial, vacila na boca de quem lê (Robert Lowell tem um belo livro chamado Imitations, em que ele imita os seus queridos).

[...]

A militância cultural do grupo concretista inclui a tradução divulgação como atividade fundamental. [...] Movimento 1, movimento 2: o projeto ideológico se manifestava na trilha dos autores (não se tratava de traduzir "qualquer um"; traduzir também era um gesto teórico, e didático), mas ao mesmo tempo não traía a qualidade literária com mão pesada: o garbo de traduzir era aqui especialmente inteligente. O tradutor também é um sedutor.


(CESAR, A.C. Pensamentos sublimes sobre o ato de traduzir. In: FREITAS FILHO, A. (Org.) Escritos no Rio: Ana Cristina César. 1. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 1993)


Ficamos intrigados com essa ideia de imitação ao invés de tradução: o que seria isso? E também com esse terceiro movimento que ela esboça ali no final: a tradução como forma de seduzir. Seduzir quem? Pra que? Como?

Sobre linguagem, levei uns trechos de um livro muito arrogantinho do Ezra Pound, chamado ABC da Literatura. O Ezra Pound, além de poeta, traduziu muita coisa para o inglês, das mais diversas origens, chinês, grego, espanhol, inglês arcaico. Nesse livro ele se propõe a explicar como se deve ler e o que é importante ler, trazendo inclusive uma lista ao final. Deixando de lado a pretensão dele, tem alguns pontos interessantes que dá pra destacar.

Olha o que ele diz:

O que é literatura, o que é linguagem, etc.??

Literatura é linguagem carregada de significado.
"Grande literatura é simplesmente linguagem carregada de significado até o máximo grau possível"

Mas, linguagem?
Falada ou escrita?
Linguagem falada é ruído dividido num sistema de grunhidos, assobios, etc. Isso é chamado de fala "articulada"

"Articulada" significa que ela está dividida em zonas e que um certo número de pessoas está de acordo com esse zoneamento.

Vale dizer que estamos mais ou menos concordes quanto aos diferentes ruídos representados por

a, b, c, d, etc.

A linguagem escrita, como afirmei no primeiro capítulo, pode consistir (como na Europa, etc.) em signos representando esses vários ruídos.As pessoas se põem mais ou menos de acordo em que grupos desses ruídos ou signos devem corresponder a determinado objeto, ação ou condição.

gato, movimento, róseo.

A outra espécie de linguagem começa como um desenho do gato, ou de algo que se move ou existe, ou de um grupo de coisas que ocorre sob certas circunstâncias ou que participa de uma qualidade comum a todas elas.


Bom, mesmo que se tente fazer uma adaptação entre o que ele está chamando de linguagem e o que a gente gostaria de entender por dança como linguagem, isso não funcionaria para o que nós, este grupo, temos nos acostumado a chamar de dança contemporânea. Não necessariamente se trabalha com signos sobre os quais há mais ou menos um acordo comum.

Por outro lado, é legal observar que o que ele coloca aí remete àquela essencialidade" que eu tinha achado tão estranha no texto do projeto. "Grande literatura" (e sabedeus o que seria isso) "é simplesmente linguagem carregada de significado até o máximo grau possível". E como diabos se carrega a linguagem de significado até o máximo grau?


Diz ele:

A linguagem é um meio de comunicação. Para carregar a linguagem de significdo até o máximo grau possível, dispomos [...] de três meios principais.


1. Projetar o objeto (fixo ou em movimento) na imaginação visual.

2. Produzir correlações emocionais por intermédio do som e do ritmo da fala.

3. Produzir ambos os efeitos estimulando as associações (intelectuais ou emocionais) que permaneceram na consciência do receptor em relação às palavras ou grupos de palavras efetivamente empregados.


Ele diz que o primeiro seria a fanopéia, o segundo a melopeia e o terceiro a logopeia.

A incompetência se manifesta no uso de palavras demasiadas. O primeiro e mais simples teste a que um leitor deve submeter o autor é verificar as palavras que não funcionam; que não contribuem em nada para o significado ou que distraem do fator mais importante do significado em favor de fatores de menor importância.

É legal lembrar que eu trago essas referências justamente para tentarmos talvez traduzi-las para o campo do nosso objeto, que é uma obra de dança contemporânea que se pretende transpor em outras coisas.

Pensando nisso, propus um exercício de composição que o Ezra sugere para alunos que querem ser escritores. A ideia seria que a gente primeiramente traduzisse esse exercício para o nosso campo aqui, e depois praticasse. É o seguinte:


1. Fazer com que os alunos troquem suas composições entre si e verifiquem quais e quantas palavras inúteis foram usadas - quantas palavras não transmitem nada de novo.

2. Quantas palavras obscurecem o significado.

3. Quantas palavras estão fora do seu lugar usual e se essa alteração torna o significado de algum modo mais interessante ou mais cheio de energia.

4. Se a sentença é ambígua: se ela realmente significa mais de uma coisa ou mais do que o escritor pretendia; se ela pode ser lida de modo a significar algo diferente.

5. Se há algo que está claro quando lido mas que fica ambíguo quando falado.



(POUND, E. ABC da Literatura. Tradução de Augusto de Campos e José Paulo Paes. São Paulo: Cultrix, 1970)


ENCONTRO 3

No encontro seguinte, eu não levei nada. Falamos um pouco das coisas que a Beti e o Ricardo vêm produzindo como traduções de seus trabalhos. Comemos um pão que a Beti tinha feito e vimos alguns vídeos. O Ricardo comentou sobre o conto que ele está escrevendo.

Ao tocar novamente no conceito de tradução ficamos em dúvida se seria possivel traduzir uma dança para outra dança. Eu acho que não. Comentamos também que estavam faltando limites para o que eles estão produzindo, eles estão muito soltinhos e eu não consigo ver no produto uma tradução.

Chegamos a um consenso temporário de que em traduzir há uma intenção de transpor a totalidade de uma coisa para um outro suporte, por exemplo, traduzir a totalidade de um poema, um romance, ou até um parágrafo para outra língua. Eu acrescento aqui - não lembro se falei na hora - transpor a partir de relações de equivalência. Ou seja, dizemos, ou convencionamos, ou queremos acreditar, que um determinado objeto no meio X se equipara a outro objeto do mesmo valor no meio Y.

Discutimos também a direção da tradução. O Ricardo falou uma coisa que eu achei legal, que quando se traduz há geralmente uma necessidade de se conhecer bem a lingua de destino e não necessariamente a lingua de origem. O nosso campo, o nosso objeto, consiste justamente no contrário: os autores de peças de dança contemporânea querem produzir traduções das peças que fizeram para um suporte que desconhecem, ou que conhecem menos. Será que vale?

Propus que ambos fizessem uma tradução de um parágrafo qualquer, em qualquer língua de origem, para o português (vi que a Beti já fez), para que a gente pudesse discutir que critérios foram usados para escolher as palavras e que relações de equivalência foram estabelecidas entre esses objetos. Posso acrescentar aqui umas perguntas: em que momentos nos orientamos pela sonoridade das palavras (a melopéia do Pound)? Em que momentos foi pelo significado ou pela imagem mental que se forma a partir da palavra (a fanopéia)? Em que momentos foi pelos dois (a logopéia)? Até que ponto houve arbitrariedade? Até que ponto eu me manifesto quando traduzo? Até que ponto eu quero seduzir? Até que ponto eu imito algo ou alguém?

domingo, 15 de março de 2009

A Rapariga Vodu de Tim Burton

Experiências





Vodus, espinhos, ferimentos

Esse “coração vodu” foi uma das minhas primeiras experiências de tradução. Fiz no dia do meu aniversário e ofereci para as pessoas: comer o coração, comer meu próprio coração. Ferir, espetar - essa idéia me persegue desde o processo de criação de amarelo, ela está no cacto, nas sessões de acupuntura que eu fazia, na idéia de ser atravessada por algo.

É também uma tradução de uma ilustração de Tim Burton para “A Rapariga Vodu” (in: BURTON, Tim. A morte Melancólica do Rapaz Ostra e Outras Estórias. Lisboa: Errata Edições, 2000)




Andei espetando coisas com esses palitinhos engraçados, e finalmente comprei uma “besta”, uma espécie de arco e flecha com gatilho. Estou praticando...

Listas, arquivos, lógicas de organização e apresentação

Se o amarelo fosse um texto seria uma lista, o release sempre foi:

plástico, massa, goiabada, cacto, dança
tarsila, boca, galinha

a idéia de propor uma lógica de organização (de palavras em grupos, de elementos em cena, de imagens numa projeção), também esteve muito presente no processo de criação, e está relacionada a inventários e breviários, termos que eu utilizei tantas vezes escrevendo sobre o amarelo.

Hoje esse interesse deriva um pouco para coleções e arquivos, especificamente de imagens, que tenho encontrado (des images trouvés) ou produzido. Emendo aqui uma questão-procedimento: além de propor uma lógica de organização e apresentação destas imagens, como posso habitar estes espaços bidimensionais?


Imitações, variações e agora também traições

Numa das nossas conversas sobre tradução, o Gustavo falou do tradutor como um “imitador”.
Então me perguntei como seria uma “imitação” do amarelo? E pensei mesmo numa imitação-plágio (aquela que modifica poucos elementos e mantém clara a estrutura original), e substituí o plástico amarelo por um plástico preto.
Comecei a variar ações com este material em vídeo.
O que me consome nessas tentativas é a falta de presença (neste sentido de “estado corporal” ) na mídia vídeo. Como bem perguntou o Neto: como gerar presença (um aspecto que me é tão caro em amarelo) para o vídeo? E como gerar uma fruição coerente com a idéia de “convite ao outro”, e de “experiências sensoriais” de que eu tanto falo para esta peça?

Agora me pergunto também se o preto não é uma traição, e como eu poderia então investir e espalhar essa traição para outros elementos, estados corporais, modos de organização?

Trabalho...

Uma receita

Há mais de três anos misturo 5 kg de farinha de trigo, meia garrafa de óleo, e água até dar o ponto para fazer a massa do amarelo. De tanto escutar “você já assou isso?”, um dia eu assei mesmo. Depois do ensaio, a massa bem pisada, recheei com goiabada (claro) e assei no forno do Cafofo. Michelle, Gustavo e Neto comeram um pedaço disso que era quase eu mesma.

Achei que seria apropriado traduzir amarelo para uma receita e essa receita seria sim um pão. Tenho testado combinações, cores e formatos e acho que estou perto de chegar a algum lugar.

Essas são as traduções que tenho conseguido colocar em prática, ainda existem aquelas que povoam meu imaginário e minhas vontades... falo delas num outro capítulo.

Elisabete

Como diria Stéphany Mattanó: “quero saber do que estou falando!”

Recuperando as perguntas lançadas pelo Ricardo, sinto duas questões muito fortes pra mim neste processo de pesquisa. A primeira diz respeito justamente a ser este um projeto de pesquisa, sem a pretensão e o objetivo de produzir espetáculos ou coisas espetaculares semelhantes. Isso me dá o enorme prazer e liberdade para experimentar ações, buscando “traduzir” meu amarelo, varia-lo, modifica-lo, etc.
Etc mesmo? Essa é a segunda questão. Há limites para o que chamamos de tradução? E o que afinal de contas estamos chamando de tradução? Temos conversado sobre isso...

Consultando o dicionário - essa fonte primária e um tanto rasa, mas sempre radical (radical referindo-se àquilo que está na raiz)

Tradução é uma atividade que abrange a interpretação do significado de um texto em uma língua — o texto fonte — e a produção de um novo texto em outra língua mas que exprima o texto original da forma mais exata possível na língua destino.

Quem desconhece o processo de tradução quase sempre trata o tradutor como mero conhecedor de dois ou mais idiomas. Traduzir vai além disso. Há um famoso jogo de palavras em italiano que diz "Traduttore, Traditore", cuja tradução é "Tradutor, traidor".

Guardo duas coisas importantes daqui: a idéia de exatidão/precisão da tradução – exatidão e precisão com relação à quê? À fonte? Ao destino?

E a idéia de traição – traduzir é trair? E pode o autor trair a própria obra?


Recentemente, o Gustavo lançou a proposta de experimentarmos uma inversão: entender amarelo e quase nu como sistemas (linguagens) e tentar traduzir algo para esses sistemas. Gustavo (que é tradutor, no sentido mais próximo do dicionário) também propôs um exercício: escolher um parágrafo de um texto qualquer em outra língua e traduzi-lo para o português, observando os parâmetros e estratégias que utilizamos para executar esta tarefa.

Escolhi um trecho de “Les Nuages”, um texto de Tarkos (TARKOS, C. Pan. Paris: P.O.L éditeur, 2000).

Minha tradução:

As nuvens são belas, brancas as nuvens são brancas, azuis, as nuvens sao belas, sujas, as nuvens nadam, as crianças fazem amor, começam a crescer, sussurram, amadurecem, passam, não recuam, retornam, descem, as nuvens nadam, as nuvens voam, são belas imortais, cobrem todo o céu, preenchem o céu, tornam o céu mais branco, não se torcem, se espalham fazem novelos, as nuvens não servem para nada, a cima de nossas cabeças, escorregam, estão no céu, estão sobre os olhos, basta levantar os olhos para vê-las deslizando sobre nos os movimentos são tão lentos, não há movimento no céu, as nuvens deslizam lentamente, tão lentamente as nuvens voam, penetram, elas estao por todo o céu, o que resta é o azul, o azul do céu, manchas azuis, as crianças são jovens e brancas, as crianças são doces, são belas, as crianças fazem amor, se fazem amor entre eles, estao fazendo amor entre eles agora, são jovens e doces, as manchas azuis são parecidas com as manchas brancas das nuvens os tapetes brancos de nuvens se espalham, foram espalhados, estao espalhados, ocupam espaço no céu (...)

O original de Tarkos:

« Les nuages sont beaux, blancs les nuages sont blancs, bleus, les nuages sont beaux, immondes, les nuages nagent, les enfants font l’amour, lèvent, soufflent, grandissent, passent, ne reculent pas, se retournent, descendent, les nuages nagent, les nuages volent, sont beaux immortels, couvrent tout le ciel, remplissent le ciel, rendent le ciel plus blanc, ne tordent pas, s’élargissent font des nuée, les nuages ne servent à rien, au-dessus de nos têtes, glissent, sont sur le ciel, sont sur les yeux, il n’y a qu’à lever les yeux pour les voir glisser au-dessus de nous les mouvements sont si lents, il n’y a pas de mouvementes dans le ciel, les nuages glissent lentement, si lentement les nuages volent, s’envoncent, il y en a partout dans le ciel, ce qui reste est du bleu, le bleu du ciel, des taches bleues, les enfants sont jeunes et blancs, les enfants sont doux, les enfants sont jolis, les enfants font l’amour, se font l’amour entre eux, sont en train de faire l’amour entre eux, sont jeunes et doux, les taches bleues sont semblables aux taches blanches des nuages les nappes blanches des nuages s’étalent, se sont étalées, sont étalée, prennent la place dans le ciel (...) »

Uma primeira conclusão: parece mais fácil traduzir algo que não é meu. Sinto que posso enquadrar qualquer deslize na minha interpretação subjetiva sobre a obra. A situação é um pouco mais complicada quando a obra a ser traduzida é minha. A minha interpretação subjetiva sobre a minha própria criação parece ter a responsabilidade de ser um tanto mais objetiva que as possíveis interpretações de outras pessoas...



Elisabete

amarelo - "se fosse seria"

Segue a minha versão para amarelo na proposta do “se fosse seria”.


Se fosse um objeto seria uma bacia
Se fosse um prato seria um ovo cru e ainda quente, recém saído do interior da galinha
Se fosse uma canção seria “o quereres” de Caetano Veloso
Se fosse um personagem de ficção seria uma mistura da Macabéa (de Clarice) com Angela (Une femme est une femme, de Jean Luc Godard)
Se fosse um filme seria “les bijoutiers du claire de lune”, de Roger Vadim
Se fosse um lugar seria um ringue
Se fosse um aviso seria “depois de aberto melhor consumir em até 3 dias”
Se fosse um elemento seria terra
Se fosse um efeito seria uma cicatriz
Se fosse um vegetal seria um cacto
Se fosse um planeta seria Terra
Se fosse um advérbio de tempo seria agora
Se fosse uma estação do ano seria Verão
Se fosse um animal seria uma galinha
Se fosse um barulho seria um grito
Se fosse uma cor seria amarelo
Se fosse um clima seria tropical
Se fosse uma roupa seria um maiô
Se fosse uma fruta seria uma manga
Se fosse uma viagem seria Positano
Se fosse um amor seria carnal
Se fosse um remédio seria um anticoncepcional
Se fosse uma hora do dia meia dia
Se fosse uma mulher seria uma mistura de Brigitte Bardot e Lygia Clark
Se fosse um homem seria uma mistura de Serge Gainsbourg com Werther
Se fosse um quadro seria Antea
Se fosse um sapato seria uma sandália de couro com tiras amarradas nas pernas
Se fosse um talher seria uma colher
Se fosse um veículo seria uma moto
Se fosse um mês seria fevereiro
Se fosse um metiêr seria cozinheira
Se fosse um livro seria « Fragmentos de um discurso amoroso », de Roland Barthes
Se fosse uma citação seria « e quem foi que disse que durar é melhor do que queimar ? » Roland Barthes
Se fosse uma estampa seria « não sei » (leia na minha camisa...)
Se fosse uma parte do corpo seria o suvaco
Se fosse uma dança seria « de pontas e dobras »


Beti

partilhando referências - Mitologias

Inicio minhas postagens aqui com uma preocupação/intenção de «organizar» e partilhar referências, experiências, lógicas e idéias de trabalho.

Começo pelas referências.

Pensando em linguagem e tradução, retomei a leitura das Mitologias de Roland Barthes (BARTHES, Roland. Mitologias. Rio de Janeiro: Difel, 2007). No final do livro, depois das mitologias propriamente ditas, há um capitulo 2 intitulado “o mito hoje”. Nele, Barthes apresenta o mito de uma forma complexa e apaixonante: “o mito é uma fala”, é um sistema de comunicação, uma mensagem. Tudo pode constituir um mito, desde que seja suscetível de ser julgado por um discurso. Entende-se aqui por linguagem, discurso, fala, toda a unidade ou síntese significativa, quer seja verbal, quer visual.

Pensei logo no amarelo como mito.

Barthes apresenta o mito como um sistema semiológico segundo, que depende de um primeiro: significante (imagem) associado a um significado (conceito) formam um signo, que será o significante do mito, e ganhará dentro da estrutura mítica um novo significado, gerando um novo signo.

Entao, pensei amarelo como signo de um sistema semiológico primeiro e significante dentro da estrutura do mito (mito = tradução de amarelo).

Barthes fala ainda que o conceito mítico pode ser reapresentado de diversas formas - “essa repetição do conceito por meio de formas diferentes é preciosa para o mitólogo, pois permite-lhe decifrar o mito: é a insistência num comportamento que revela sua intenção”

E então pensei as traduções de amarelo como reapresentações do mesmo mito amarelo. Voltando à primeira reflexão: amarelo como mito, reapresentado de diversas formas (traduções).

Finalmente, guardo de todo este capítulo uma idéia de estruturas e elementos que se combinam num sistema, se preenchem, se atualizam e se reapresentam constantemente, segundo aspectos históricos, sociais, ideológicos e (acrescento eu) criativos. Uma focalização dinâmica, capaz de ler e decifrar o mito, relacionando o esquema mítico com uma historia geral, com os interesses de uma sociedade definida, levando em conta o movimento que consta do/no mito.


leitura difícil mas muito inspiradora...

bj

Beti

terça-feira, 10 de março de 2009

Um dos primeiros exercícios partilhados

Ainda em janeiro, em nossas primeiras semanas de trabalho, um dos primeiros exercícios que surge é proposto pela Beti. Tendo como referência uma iniciativa que ela conheceu na França, ela nos incentivou a produzir uma lista que indicasse de maneira direta e imediata uma tradução de nossas obras.

A idéia é: "Se o Quase nu fosse um objeto, que objeto seria?"

Abaixo minha lista:

Se fosse um objeto uma bola de vifro fumê
Se fosse um prato arroz primavera
Se fosse uma canção MANIAC (Michael Sembello)
Se fosse um personagem de ficção Pinocchio
Se fosse um filme Minha vida m cor-de-rosa
Se fosse um lugar meu quarto na casa dos meus pais
Se fosse um aviso saída de emergência
Se fosse um elemento Fogo
Se fosse um efeito transparência
Se fosse um vegetal copo de leite vermelho
Se fosse um planeta Plutão
Se fosse um advérbio de tempo Agora
Se fosse uma estação do ano Verão
Se fosse um animal Um felino qualquer
Se fosse um barulho Um grito
Se fosse uma cor seriam duas: vermelho e branco
Se fosse um clima quente e úmido
Se fosse uma roupa saia vermelha
Se fosse uma fruta caqui
Se fosse uma viagem volta ao mundo em 80 dias
Se fosse um amor de irmão
Se fosse um remédio uma anfetamina qualquer
Se fosse uma hora do dia meia noite
Se fosse uma mulher algo entre Diana Ross e Amy Whinehouse
Se fosse um homem eu
Se fosse um quadro chronos devora seus filhos (GOYA)
Se fosse um sapato DG vermelho, salto 15, bico fino.
Se fosse um talher faca
Se fosse um veículo quase uma ferrari vermelha
Se fosse um mês fevereiro
Se fosse um metiêr dançarina de boate
Se fosse um livro o diário de um hermafrodita
Se fosse uma citação "Sem sono e nem razão para o ter, há em mim uma grande vontade de dormir" (Fernando Pessoa, livro do desassossego)
Se fosse uma estampa "eu já vi o bozo. e vc, viu?"
Se fosse uma parte do corpo o esterno
Se fosse uma dança tarde de um fauno (nijinski)

Foi um momento interssante para resgatar o trabalho e me interrogar com relação a ele.
A idéia é que depois de passarmos pelos meses de trabalho (traduzindo e transmitindo), possamos retomar e atualizar essa lista.

Fica aqui o convote para que quem já conhece a obra faça sua lista a poste aqui!!!!

Eu adoraria ter diversas listas como material de trabalho...

Abração,
Ricardo.

terça-feira, 3 de março de 2009

Primeiras experiências do Ricardo.

O primeiro grande desafio que tive que enfrentar para dar início às minhas experiências de tradução de quase nu foi o fato de ainda não me sentir amplamente satisfeito com o próprio quase nu enquanto obra.

Muitas dúvidas ainda permeiam a relação que estabeleço com o material levantado no processo de criação (dez 2007 - abril 2008). Como então pensar em estratégias de tradução de algo que ainda se apresenta como obra em processo?
Minha resposta para essa questão é: tratando a obra dessa maneira.
Estou entendendo que pensar as traduções é mais uma forma de continuar pensando o próprio quase nu, revivendo, atualizando.

Tendo esse pensamento como ponto de partida, três propostas tem tomado meu tempo de experimentação. São elas, na ordem que apareceram:

1. UM CONTO. Uma tentativa de ficar quase nu em prosa. Trata-se de um triângulo amoroso entre Alice (aquela que foi pro país das maravilhas), Pinocchio (aquele que é quase um menino de verdade) e Pequeno Príncipe (aquele que mora no asteróide B612). Todos eles são uma versão de mim e são carregados da década de 80, como eu.

2. UMA MÚSICA. O desafio é produzor música a partir de meus desejos de movimento no quase nu. estou procurando produzir músuca a partir de coreografia. Como que invertendo a relação tradicional entre música e dança. Tem um músico me ajudando.

3. DESENHOS. Tenho desenhado bastante. Sou péssimo com desenhos, e essa é a questão. estou investigando formas de me desnudar nesse campo, que não domino, não conheço, mas me interessa.

Tudo está em andamento e ainda não me sinto a vontade ara partilhar resultados com vocês aqui. Mas espero em breve poder fazer isso.

Bom, vamos conversando.

Beijos do Ricardo.

Pontos de partida conceituais: CONVOCANDO TODO MUNDO!

Uma questão que tem convivido muito contundentemente com o dia a dia de nossas experiências nessa fase do projeto é a dificuldade que temos tido para circunscrever um universo conceitual que baseie o que estamos entendendo por TRADUÇÃO.

Nas diversas conversas e experimentos que temos realizado muitas concepções tem emergido, no entanto elas são dispersas e em alguns casos até conflitantes.

Nesse sentido lançamos aqui, no blog, essa questão...
Vamos partilhar um pouco de nossas referências nesse sentido????

- o que entendemos por tradução?
- como isso se aplica a obras de arte?
- qual a(as) função(ões) de uma tradução?
- e quais as atribuições de um bom tradutor?

enfim...
conversemos!

beijos do ricardo.